segunda-feira, 31 de outubro de 2016

CHÁ DAS CINCO: ADÉLIA PRADO

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ADÉLIA PRADO (FOTO: ARQUIVO GOOGLE)



PARA O ZÉ



Eu te amo, homem, hoje como

toda vida quis e não sabia,

eu que já amava de extremoso amor

o peixe, a mala velha, o papel de seda e os riscos

de bordado, onde tem

o desenho cômico de um peixe — os

lábios carnudos como os de uma negra.

Divago, quando o que quero é só dizer

te amo. Teço as curvas, as mistas

e as quebradas, industriosa como abelha,

alegrinha como florinha amarela, desejando

as finuras, violoncelo, violino, menestrel

e fazendo o que sei, o ouvido no teu peito

pra escutar o que bate. Eu te amo, homem, amo

o teu coração, o que é, a carne de que é feito,

amo sua matéria, fauna e flora,

seu poder de perecer, as aparas de tuas unhas

perdidas nas casas que habitamos, os fios

de tua barba. Esmero. Pego tua mão, me afasto, viajo

pra ter saudade, me calo, falo em latim pra requintar meu gosto:

“Dize-me, ó amado da minha alma, onde apascentas

o teu gado, onde repousas ao meio-dia, para que eu não

ande vagueando atrás dos rebanhos de teus companheiros”.

Aprendo. Te aprendo, homem. O que a memória ama

fica eterno. Te amo com a memória, imperecível.

Te alinho junto das coisas que falam

uma coisa só: Deus é amor. Você me espicaça como

o desenho do peixe da guarnição de cozinha, você me guarnece,

tira de mim o ar desnudo, me faz bonita

de olhar-me, me dá uma tarefa, me emprega,

me dá um filho, comida, enche minhas mãos.

Eu te amo, homem, exatamente como amo o que

acontece quando escuto oboé. Meu coração vai desdobrando

os panos, se alargando aquecido, dando

a volta ao mundo, estalando os dedos pra pessoa e bicho.

Amo até a barata, quando descubro que assim te amo,

o que não queria dizer amo também, o piolho. Assim,

te amo do modo mais natural, vero-romântico,

homem meu, particular homem universal.

Tudo que não é mulher está em ti, maravilha.

Como grande senhora vou te amar, os alvos linhos,

a luz na cabeceira, o abajur de prata;

como criada ama, vou te amar, o delicioso amor:

com água tépida, toalha seca e sabonete cheiroso,

me abaixo e lavo teus pés, o dorso e a planta deles

eu beijo.





PALAVRAS & EXPRESSÕES


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DE ONDE VÊM AS PALAVRAS:
NÓ GÓRDIO

POR DEONÍSIO DA SILVA (*)

Blog do Augusto Nunes
EM 30/10/2016

Deu um nó nos três poderes referenciais da República. Executivo, Judiciário e Legislativo parecem de repente amarrados uns aos outros, e não independentes. Mas será um nó górdio?

Ao signatário cabe apenas lembrar a origem das duas frases tão célebres: DAR UM NÓ e NÓ GÓRDIO.  Acerca de sua significação política atual, o titular da coluna, o jornalista Augusto Nunes, desceu, como sempre, o seu “claro raio ordenador”.

A primeira frase, DEU UM NÓ, procede de Portugal e da Índia, que tiveram laços perigosos durante muito tempo. Na terrinha, dar um nó era casar. E, como os vínculos do matrimônio católico, além de indissolúveis, eram e são perpétuos, quando se dizia que alguém tinha dado um nó, era indicação de que tinha casado.

Na Índia não era metafórico, era literal. Era costume dar um nó na cauda das roupas da noiva e do noivo. Passou depois a indicar situação complicada, mas ainda como casar aparece em As variedades de Proteu, de Antonio José da Silva, o Judeu (1705-1739), escritor brasileiro de apenas 34 anos, executado em Lisboa no garrote vil e depois queimado, enquanto a algumas quadras dali estava em cartaz uma peça de sua autoria. O trecho diz: “E antes te aperte o nó do Himeneu/ do que na garganta te aperte outro nó”. Ele teve premonição da tragédia que o vitimou! Deu um nó na garganta e não foi metafórico, foi literal.

Já a expressão NÓ GÓRDIO designa extraordinária dificuldade em determinada questão. Define o cerne de um assunto complicado, como é o caso. A história desta frase remonta aos tempos de Alexandre, o Grande (356-323 a.C.), senhor de um império que incluía quase o mundo inteiro.

De acordo com a lenda, quem desatasse o nó que atava a canga ao cabeçalho do carro feito por um camponês frígio, dominaria o Oriente. O carro estava no templo de Zeus, na Frígia, região onde hoje está a Turquia.

Do nó, feito com perfeição, não se viam as pontas. Alexandre tentou desamarrar e, não conseguindo, cortou-o com a espada. E desde então este gesto tem servido de metáfora para designar ações ousadas com o fim de resolver problemas.

Não chamem políticos supersticiosos para a tarefa. Tancredo Neves, quando viajava pela Índia, ao receber de presente um elefante de jade, ouviu o conselho de desfazer-se da oferenda porque o bicho estava com a tromba virada para baixo e isso dava azar. Ele, sem que o indigitado transeunte entendesse o gesto, deu a estatueta ao primeiro que encontrou.

Todos sabem o que lhe aconteceu: morreu na véspera de assumir a presidência da República. E foi substituído pelo vice, José Sarney, conhecido também por “madre superiora”, autor do romance O dono do mar, entre outros livros, mas cujo título completo, se fosse autobiografia, deveria ser O dono do Maranhão. É que, segundo o humorista José Simão, faltou espaço para a palavra completa na capa.

Os políticos nos divertem, “um divertido horror”, como diria Nelson Rodrigues, mas às vezes nos assustam muito. Foi o que aconteceu na semana passada. Alguns deles nos divertiram, mas outros nos assustaram muito.

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Deonísio da Silva é professor, 
escritor e etimologista

RAPIDÍSSIMAS


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SEM DESTINO

Nunca pegou um ita no Norte. Nem poderia. Nunca teve norte.

FINADOS

No dia dos mortos, seja vivo: leve as crianças para passear, pague sorvete para a namorada, mulher, amante. Celebre a vida. Ela é curta que só. Os mortos lhes serão ternamente gratos.

FINADOS (II)

Quem lhe disse que mortos gostam de flores e velas?

FINADOS (III)

Uns deixam saudade. Muitos nem isso.

HORÁRIO DE VERÃO

Não presta. Espicha o mais improdutivo dos períodos: a tarde.

HORÁRIO DE VERÃO (II)

Que serventia tem tardes tão longas, para quem não tem uma belle de jour?

AUTOENGANO

Continua o mesmo de sempre. Ou seja, vivendo das conquistas que jamais conquistou. 

CAZUZA

O melhor amor é o inventado.

ESPAÇO DA GLÓRIA

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A BRUMA

Os lobos uivam, os morcegos sugam,
nuvens têm cor de chumbo, em vez de prata,
o caos se faz, os seres não se amam…
eu já não tenho medo de barata.
Bate uma bruma na minha epiderme,
e me azucrina como um ignóbil verme.
Porém, a luz celestial de um astro
vem ajudar-me a percorrer meu trilho.
mas uma sombra cobre o alabastro,
e meu caminho perde todo o brilho…
A densa bruma, em exasperação,
sombreia ainda mais meu coração
Perdi meu rumo, não encontro o cais,
não me consola esta suave brisa.
Meu pensamento não emite mais
os poemas de amor da poetisa…
Maldita bruma! Transformou-se em praga
dentro do cerne, e logo se propaga!
Saio do transe e vejo a realidade:
minha idade real que me reforça
sentir na alma a eternidade…
a luz da lua brilha com mais força!
Todo meu ser se livra do cansaço
daquela bruma sempre ao meu encalço.

Glória Braga Horta 
nasceu em Mutum-MG. 
É jornalista, poeta e cronista.
Dedica-se também à música popular 
(canto e teclado)
e às artes plásticas


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