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A VINGANÇA
(Por Violante Pimentel) Dona
Marta era uma sofredora. O marido, alcoólatra inveterado, era um péssimo
companheiro e um péssimo pai. Do tipo que elege o horário das refeições para
acerto de contas com os filhos e a mulher. E a mesa, que era pra ser um lugar
sagrado, havia se tornado um palco para grosserias e repreensões do dono da
casa com relação aos três filhos do casal.
Foram
muitos anos de sofrimento de Dona Marta e dos filhos, quando, no casamento, era
respeitada a regra “até que a morte os separe”.
Beirando
os sessenta anos, Seu Manoel, o marido, foi acometido de morte súbita, vítima
de um AVC.
Como
era costume antigamente, o velório ocorreu em casa, e a vizinhança toda
compareceu. Ao meio dia, chegou do interior uma grande amiga e comadre de Dona
Marta, depois de ter recebido a comunicação da morte do compadre pela Estação
Ferroviária. Na ocasião da chegada da comadre, como era hora de almoço, a sala
estava mais ou menos vazia. O corpo estava sendo velado, e o sepultamento seria
à tarde.
Preocupada
em ver a comadre, Marieta foi direto à sua procura. Passou pelos quartos, mas
não havia ninguém. Procurou a comadre pelos quatro cantos da casa, mas não
encontrou. Lembrou-se de ir até um terraço no final da casa. Lá estava a viúva, atracada com um enorme
prato fundo, transbordando de feijão, arroz, farinha, e um bom pedaço da
mistura. Lágrima nos olhos, nenhuma.
Comovida,
Marieta abraçou Dona Marta chorando, e estranhando a frieza e o autocontrole da
mulher. Afinal de contas, o falecido jazia sozinho na sala àquela hora, e ela ali
se empanturrando de comida...
De
repente, Dona Marta desabafou:
-Sabe,
comadre Marieta? Em quase trinta anos de
casada, pela primeira vez esse infeliz, esse filho de uma puta, está me
deixando comer sossegada!!!
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