De
repente, um pequeno sinal que coça, sangra e não quer cicatrizar, aparece no
meu peito direito. Vou ao dermatologista e ele é incisivo: "Pode ser um
tipo benigno de câncer de pele. Vamos tirar. Só a biópsia poderá nos dizer com
certeza". Concordo e marcamos data da cirurgia. Ele me pergunta se durante
a minha vida tomei muito sol. Respondo que sim.
A
minha infância, adolescência e juventude foi toda passada na praia do Pina,
onde costumava bater bola, pescar e me masturbar dentro dágua, olhando as
meninas que tomavam sol nas areias ou jogavam frescobol.
Ele
diz que esse foi o meu mal. Fico sem entender se se refere ao sol ou ao vício
solitário, que nos propiciava tanto prazer e, ao mesmo tempo, tantos medos e
dores de consciência. Naquele tempo, masturbação provocava fraqueza, anemia e
fazia nascer até cabelo na palma da mão, além é claro dos prováveis castigos
divinos. Na dúvida, resolvo culpar o sol por meus males. Além do mais, hoje, a
masturbação já foi reabilitada e recomendada. Faz bem até para a próstata. Quem
quiser que tente entender a ciência...
Entre
as meninas que frequentavam a praia, naquela época, havia uma que se chamava
Bete e que conseguia mexer deveras com o lado pecaminoso do meu cérebro
nervoso. Estava sempre cercada de amigas e pretendentes. Durante um certo
tempo, alimentado por várias punhetas, curti por ela um amor platônico. Um dia,
chego na praia e Bete está sozinha, sentada nas pedras, com um biquini
estampado em preto e branco, contrastando com o azul do céu e o verde do mar.
Sem querer querendo, resolvo abordá-la. Ela mostra-se simpática. A conversa
deslancha, rimos muito e acabamos nos beijando dentro de uma poça dágua, sob o
sol escaldante do meio dia. Nos despedimos e vou para casa com a pele e o
coração em brasa. Eu havia conseguido. Bete era um peixe graúdo, almejado por muita
gente. No dia seguinte, encontramo-nos novamente. Ela estava diferente. Diz que
tudo aquilo que acontecera fora uma coisa do momento, que eu não a levasse a
mal, mas que queria apenas ser minha amiga. Aceitei a contragosto. Não tinha
outra opção. Mas tinha a esperança de reverter o quadro. Soube depois, através
do meu amigo Val, que ela dissera que eu não sabia beijar e que não namoraria
comigo por causa disso. Achei aquilo tudo uma idiotice. Desfiz todos os meus
sonhos e pretensões e terminei concordando com o Val: "Esqueça aquela
mulher, Clóvis. Aquilo é uma rapariga safada. Não vai te fazer bem". Achei
que ele estava certo.
CLÓVIS CAMPÊLO |
E
por falar em raparigas, elas também faziam parte do cenário do Pina. A zona do
bairro era conhecida e conceituada. E foi no Alaíde Drink's que conheci
Lindomar. Era baixinha, galega e logo se insinuou para mim. Encarei. Ela me
pediu para colocar uma música na radiola de fichas. Era "Rock'n'roll
Lullaby", com B. J Thomas. "Adoro essa música", disse-me ela.
Dançamos um pouco e tomamos algumas cervejas. Logo já estavámos envolvidos.
Passei a frenquentar a pensão e namorar com Lindomar nos intervalos dos seus
clientes. Eu era o seu escolhido. O romance durou algumas semanas, até o dia em
que, numa briga na pensão, ela levou um tiro no pé e precisou ser
hospitalizada. Nesse dia, eu estava prestando serviço à gloriosa Força Aérea
Brasileira e não pude ir ao seu encontro. Vivi momentos de angústia, sem ter
notícias suas. Até que um belo dia ela voltou ao trabalho e nos reencontramos.
Achei-a diferente, desinteressada por mim. Perguntei o que havia e ela mesma me
contou que estava apaixonada por um enfermeiro que cuidara dela no hospital.
Queria ficar com ele. Foi assim que terminou o meu romance com Lindomar. Nunca
mais dancei o "Rock'n'roll Lullaby".
Recife,
2009
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