quarta-feira, 20 de maio de 2015

COISAS DA VIDA

FECHADURA VELHA



 Zé de Vina, dono de uma gráfica em Nova-Cruz, era muito conhecido na cidade, pelas suas andanças e farras homéricas. Era um assíduo frequentador da Rua do Sapo, onde fica localizada a zona do baixo meretrício. A esposa, dona Anália, mesmo sabendo da deslealdade do marido, fazia de conta que não sabia de nada, procurando sempre tapar o sol com a peneira. Preferia fazer-se de boba, para manter a harmonia do lar, e para não perturbar os quatro filhos, ainda crianças.

Entretanto, Zé de Vina era displicente demais, e não podia evitar que, uma vez por outra, chegasse batendo palmas em sua porta, uma das mulheres da "zona" de Nova-Cruz, pedindo-lhe dinheiro para fazer a feira. Dona Anália ficava de orelha em pé, desconfiada, mas não perguntava nada. Ele é que ficava nervoso e procurava justificar, dizendo que aquela pobre criatura tinha ido lhe pedir dinheiro emprestado, por estar passando necessidade.

Zé de Vina era tão astucioso, que simulava viagens a João Pessoa ou Natal, dizendo à esposa que iria comprar material para sua gráfica, e que só retornaria no dia seguinte. Dirigia-se para a estação ferroviária, ainda de madrugada, chegando por um lado e saindo pelo outro, no horário do trem. De lá, seguia direto para casa de alguma prostituta na Rua do Sapo. A esposa nem desconfiava que ele não houvesse, sequer, saído da cidade. Acreditava mesmo que tivesse viajado.

Um certo dia, dona Anália chegou à gráfica do marido e o encontrou na maior prosa com Maria Grude, uma conhecida prostituta de Nova-Cruz, que fazia parte da lista das “amantes” que lhe eram atribuídas pelas pessoas faladeiras da cidade. Dona Anália fechou a cara e passou o dia sem falar com o marido. À noite, Zé de Vina começou a adular a esposa, fingindo que não sabia por que ela estava amuada, mesmo sabendo o motivo.

Violante Pimentel é procuradora aposentada
 do Estado do Rio Grande do Norte

Não aguentando mais a insistência do marido, dona Anália resolveu dizer a verdade: Estava chateada porque o havia encontrado de prosa com aquela prostituta. Ele, muito santo, muito falso e cheio de razão, disse:

- Deixe de besteira, Anália! Como é que você tem ciúme de mim com uma mulher daquela? Você sabe muito bem que a mulher da minha vida é você! Aquela mulher é igual a uma fechadura velha, que qualquer chave abre!!!

Dona Anália fez de conta que acreditou, e guardou a sua mágoa para si.


O cinismo venceu a parada, e Zé de Vina só se aquietou depois de velho e doente.

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