O RÁDIO
(Por Violante Pimentel) João
de Teca, um feirante de Nova-Cruz, analfabeto e de raciocínio lento, adquiriu
um rádio à bateria, na loja de seu Xandu. Nessa época, ainda não havia chegado
energia elétrica na região.
Poucos
dias depois, o comprador voltou à loja para devolver o rádio, exigindo de volta
o valor que havia pago. O dono da loja se recusou a desfazer o negócio,
explicando ao cliente que isso somente seria possível, no caso de ser
comprovado no rádio defeito de fabricação. Para isso, o rádio foi submetido à
análise de um radiotécnico, ficando em observação durante oito dias. Findo esse
prazo, nele não foi constatado qualquer defeito.
Na
data marcada, João de Teca voltou à loja, para resolver o problema. Chegou
visivelmente irritado, com o propósito de devolver o rádio e receber o dinheiro
de volta. Seu Xandu, percebendo a insatisfação do cliente, determinou ao
radiotécnico que conversasse com ele e lhe comunicasse que o rádio não
apresentava qualquer defeito. Dessa forma, não havia por parte do dono da loja
obrigação de desfazer o negócio. Era a regra do comércio.
O
rádio foi posto em funcionamento, enquanto durava a discussão. O comprador não
se conformou com a explicação, e tornou a dizer que o rádio, na sua casa, havia
apresentado um grande defeito no funcionamento. Comprara o rádio mais caro da
loja, mas tinha sido enganado. Com a voz alterada, o cliente esbravejava
impropérios contra o dono da loja, que tentava, inutilmente, fazê-lo entender a
situação.
Finalmente,
seu Xandu, usando de toda a paciência que Deus lhe havia dado, pediu ao cliente
que explicasse qual era esse defeito que somente ele via, e não fora detectado
pelo radiotécnico.
João
de Teca queimou brabo ao ser questionado, e disse que não era mentiroso, nem
ladrão. Exaltado, repetiu que o defeito do rádio era no funcionamento. E
continuou:
–
Esse rádio veio com defeito. Três dias depois que eu comprei, ele deixou de
tocar “Vem cá cintura fina, cintura de pilão”, a música que ele mais tocava. E
é a música que eu mais gosto de escutar! Tocava essa música de manhã, de tarde
e de noite! De repente, o funcionamento deu defeito e ele não tocou mais, mesmo
eu pedindo!
A
gargalhada das pessoas que estavam na loja foi grande. Aí o bicho pegou mesmo.
João de Teca se sentia desmoralizado, e não aceitava voltar para casa com
aquele rádio. O dono da loja terminou
chamando a polícia, para conter a ira do cliente.
Finalmente,
o homem saiu da loja, levando o rádio, mas dizendo, para quem quisesse ouvir,
que aquele povo era um bando de "ladrão safado", e que ele havia sido
enrolado. Um rádio que não toca “Vem cá cintura fina, cintura de pilão! Onde já
se viu?!”
Violante Pimentel é procuradora
aposentada do Rio Grande do Norte
CINTURA FINA
DE Luiz Gonzaga e Zé Dantas
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