terça-feira, 9 de dezembro de 2014

CLÓVIS CAMPÊLO

QUANDO DEZEMBRO CHEGAVA


CLÓVIS CAMPÊLO
Para mim, dezembro sempre foi um mês especial.

Primeiro, por conta do meu aniversário, no começo do mês. As alegrias começavam aí.
Depois, vinham as férias escolares. A liberdade do final das aulas deixava em aberto a praia do Pina, as peladas, as pescarias, as incursões no areial do Aeroclube, em busca de passarinhos e barba-de-bode para construir as gaiolas.

Por falar em passarinhos, a casa onde morávamos ficava junto ao Grupo Escolar Landelino Rocha, com um vasto terreno repleto de pés de oitis da praia, onde os papacapins, canários e patativas, quando chegava o verão, procriavam em profusão. No verão, aliás, o nosso quintal se coloria de pássaros, em busca dos frutos das árvores plantadas pelo meu pai.

Dezembro trazia e traz, ainda hoje, a festa de Nossa Senhora da Conceição, que mesmo sem ser a padroeira do Recife é reverenciada com fervor pela cidade inteira. E lá íamos nós para o Morro da Conceição, em Casa Amarela, rezar aos pés da Santa e também curtir o lado profano da festa.

Essa tradição de reverência foi cultivada por dona Tereza, minha mãe, até o final da vida. Um ano, no dia 8 de dezembro, acordamos tarde e notamos a sua ausência. Saíra sem deixar nenhum recado e sem dizer para onde ia. Já se aproximava a hora do almoço e nada de notícias dela. Começávamos a ficar preocupados, quando vimos na televisão a imagem da festa no morro e quem aparecia em primeiro plano? Exatamente ela, dona Tereza, que tinha ido saldar o seu compromisso com a Santa.



Mas, dezembro também era a perspectiva da aproximação do Natal, com suas festas, presentes, comidas e comemorações, numa época em que os vizinhos ainda primavam por uma política do bom relacionamento e da consideração.

Dezembro também trazia os pastoris e os reisados, tradições culturais alimentadas e mantidas pelas camadas mais pobres da população. Embora na minha rua tivesse um palco onde se apresentava o Pastoril de “Seu” Nequinho, com o seu saxofone sempre em punho, gostava de enveredar pelas comunidades do Encanta Moça e do Bode em busca de outras alegrias e alegorias.

Era uma festa de cores, sons e alegrias que culminava, no final do mês, com a entrada do Ano Novo.

Só não era feliz quem não queria.

Recife, 2010

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