MULHER DIREITA
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Seu Josias
era um antigo ferroviário de Nova-Cruz, casado com Dona Dalva, com quem tivera
apenas uma filha.
Diziam as más
línguas que esse cidadão, durante toda a sua vida, havia levado mais chifres do
que pano de toureiro. A mulher dele, bonitona e fogosa, só se aquietara mesmo
depois de velha, e por falta de oportunidade.
O trabalho de
maquinista da Rede Ferroviária Federal o absorvia muito e o afastava da vida
familiar. A administração da casa, por isso, ficava a cargo da esposa. Todos os
dias, ela arranjava um pretexto para sair de casa.
Muito vaidosa,
a mulher caprichava nas roupas justas e decotadas, que lhe realçavam o enorme
busto. Gostava de adereços e se maquiava com exagero.
O marido
nunca suspeitou da sua infidelidade. Analfabeto e sem maldade, tinha verdadeira
adoração pela mulher. Considerava a esposa uma verdadeira santa.
A filha do
casal, logo cedo, casou-se com um servidor público e foi morar em outro Estado.
As pessoas antigas e fofoqueiras incluíam nas suas conversas os casos que Dona
Dalva, quando era mais moça, havia tido, com vários homens da cidade, inclusive
com um conhecido comerciante, muito sério e acima de qualquer suspeita.
Os anos se
passaram, o casal envelheceu, permanecendo sempre muito unido. À tardinha,
colocavam cadeiras de balanço na calçada e ficavam conversando. Quase sempre se
juntava a eles, para uma boa prosa, alguma vizinha ou outra pessoa amiga que
por ali passasse. Com Seu Josias e Dona Dalva morava, apenas, uma empregada
antiga.
Num dia de
domingo, ao acordar pela manhã, seu Josias notou algo estranho na esposa e,
tocando-lhe a face, percebeu que ela estava morta. O médico da cidade foi
chamado, e atestou que a “causa mortis” havia sido um AVC.
O velório
ocorreu em casa mesmo, como era costume da época, estendendo-se por toda a
madrugada. O sepultamento seria às 8 horas. A chegada da filha, genro e neto do
casal aumentou o clima de emoção e lágrimas. À medida que a noite avançava,
diminuía o número de pessoas presentes na sala, onde o corpo estava sendo
velado.
De repente,
em plena madrugada, o velho ferroviário, soluçando copiosamente, chegou perto
do caixão, beijou a esposa, e começou a lamentar a falta que ela lhe faria e a
saudade que iria sentir. Transtornado, Seu Josias começou a fazer elogios à
falecida, repetindo diversas vezes:
--“Mulher
“dereita” tá aqui”!
A cena era comovente. Os amigos deixaram o
viúvo à vontade com a filha, o genro e o neto rapaz, e se afastaram até a
calçada. Entre eles estava o velho Paulo Benedito, dono de uma língua afiada, e
exímio conhecedor dos deslizes de adultério da falecida. Coçando a cabeça e
visivelmente irritado, pois não gostava de demagogia barata, o velho Paulo Benedito
cochichou com dois amigos:
-Ora, que
besteira de Josias, dizendo que Dalva era uma mulher direita!... Em 1935, Josias já era CORNO!!!
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