quarta-feira, 12 de novembro de 2014

COISAS DA VIDA

A ENTRADA E A SAÍDA
NA BODEGA DE SEU PAULO:
 VAI UM CAJUZINHO AÍ?

(Por Violante Pimentel) Paulo Bezerra era dono de uma pequena bodega em Nova-Cruz (RN), dessas que despachavam bebida no balcão. Era um tipo baixinho e magro, muito espirituoso, que sempre tinha resposta para tudo. Era um contador de histórias; um verdadeiro filósofo. 

Além da bodega, também era dono do "Cine Éden", único cinema da cidade, de uma pequena tipografia, e ainda de um enchimento de bebidas, onde fabricava vinho de caju e de jurubeba. O que ele tinha de bom, prestativo e caridoso, tinha de desorganizado com a contabilidade dos seus negócios. Por essa razão, nunca ficou rico. Prezava mais a pessoa humana do que o próprio dinheiro. 

O filme do "Cine Éden" começava às 20 horas, e o prefixo era a música "O Guarany". Nesse momento, Seu Paulo mandava liberar a entrada lateral, para a turma dos lisos, que aguardava esse sinal verde na praça em frente. Dentro do cinema, havia um espaço destinado aos "não pagantes".

Seu Paulo tinha tudo para ser um homem rico, mas a sua falta de ganância e a desorganização não deixavam que seus negócios progredissem. Sua esposa, dona Líndalva, era quem tomava conta da bodega, onde, pacientemente, atendia aos fregueses que ali entravam para tomar uma bicada de cachaça, cinzano, genebra, ou conhaque. Sobre o balcão havia sempre um prato com cajá, umbu ou caju, que servia de tira-gosto.

Violante Pimentel
Violante Pimentel é procuradora aposentada
 do Estado do Rio Grande do Norte
Na manhã de uma sexta-feira, no momento em que Seu Paulo se encontrava na bodega, entraram dois homens desconhecidos e se apresentaram como fiscais do Estado. Pediram para ver o livro de registro de "Entrada e Saída de Mercadoria." 

Eram onze horas, horário de maior movimento, e o trem de Recife para Natal havia chegado à Estação Ferroviária, que ficava em frente. Seu Paulo ouviu o pedido dos fiscais, e fingiu que iria buscar o referido livro dentro de uma gaveta. Mas sabia que não iria encontrá-lo, porque, simplesmente, ali ele nunca existiu. Passaram-se alguns minutos, até que o comerciante criou coragem, encarou os dois fiscais, e disse:

-- Eu vou ser sincero com vocês: Aqui só existe uma entrada e uma saída. A entrada é esta – e apontou para a boca; e a saída é esta – disse isso, virando de costas e apontando para o traseiro. 

Os fiscais, que não esperavam por esse disparate, não contiveram o riso, diante da resposta hilária de Seu Paulo. Disseram que voltariam posteriormente, e saíram para fiscalizar outro estabelecimento comercial de mais futuro.

Depois que os dois homens se distanciaram, alguns fregueses que presenciaram tudo deixaram escapar uma gargalhada uníssona. E ainda aplaudiram Seu Paulo, num gesto de gratidão ao homem bom que ele era, e que sempre os atendia muito bem, com ou sem dinheiro.





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