A
NOITE EM QUE OS HOTÉIS ESTAVAM CHEIOS
O casal chegou à cidade tarde da noite.
Estavam cansados da viagem; ela, grávida, não se sentia bem. Foram procurar um
lugar onde passar a noite. Hotel, hospedaria, qualquer coisa serviria, desde
que não fosse muito caro.
Não seria fácil, como eles logo
descobriram. No primeiro hotel o gerente, homem de maus modos, foi logo dizendo
que não havia lugar. No segundo, o encarregado da portaria olhou com
desconfiança o casal e resolveu pedir documentos. O homem disse que não tinha,
na pressa da viagem esquecera os documentos.
— E como pretende o senhor conseguir um
lugar num hotel, se não tem documentos? — disse o encarregado. — Eu nem sei se
o senhor vai pagar a conta ou não!
O viajante não disse nada. Tomou a
esposa pelo braço e seguiu adiante. No terceiro hotel também não havia vaga. No
quarto — que era mais uma modesta hospedaria — havia, mas o dono desconfiou do
casal e resolveu dizer que o estabelecimento estava lotado. Contudo, para não
ficar mal, resolveu dar uma desculpa:
— O senhor vê, se o governo nos desse
incentivos, como dão para os grandes hotéis, eu já teria feito uma reforma
aqui. Poderia até receber delegações estrangeiras. Mas até hoje não consegui
nada. Se eu conhecesse alguém influente... O senhor não conhece ninguém nas
altas esferas?
O viajante hesitou, depois disse que
sim, que talvez conhecesse alguém nas altas esferas.
— Pois então — disse o dono da
hospedaria — fale para esse seu conhecido da minha hospedaria. Assim, da
próxima vez que o senhor vier, talvez já possa lhe dar um quarto de primeira
classe, com banho e tudo.
O viajante agradeceu, lamentando apenas
que seu problema fosse mais urgente: precisava de um quarto para aquela noite.
Foi adiante.
No hotel seguinte, quase tiveram êxito.
O gerente estava esperando um casal de conhecidos artistas, que viajavam
incógnitos. Quando os viajantes apareceram, pensou que fossem os hóspedes que
aguardava e disse que sim, que o quarto já estava pronto. Ainda fez um elogio.
— O disfarce está muito bom. Que
disfarce? Perguntou o viajante. Essas roupas velhas que vocês estão usando,
disse o gerente. Isso não é disfarce, disse o homem, são as roupas que nós
temos. O gerente aí percebeu o engano:
— Sinto muito — desculpou-se. — Eu
pensei que tinha um quarto vago, mas parece que já foi ocupado.
O casal foi adiante. No hotel seguinte,
também não havia vaga, e o gerente era metido a engraçado. Ali perto havia uma
manjedoura, disse, por que não se hospedavam lá? Não seria muito confortável,
mas em compensação não pagariam diária. Para surpresa dele, o viajante achou a
idéia boa, e até agradeceu. Saíram.
Não demorou muito, apareceram os três
Reis Magos, perguntando por um casal de forasteiros. E foi aí que o gerente começou
a achar que talvez tivesse perdido os hóspedes mais importantes já chegados a
Belém de Nazaré.
O
texto acima foi publicado no livro "A Massagista Japonesa", Editora
LPM — Porto Alegre, 1982,
e extraído de "Contos para um Natal brasileiro”.
(Fonte: Projeto Releituras)
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