quarta-feira, 9 de novembro de 2016

FALA, OTÁVIO








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ARQUIVO GOOGLE




A RIFA

Erinaldo estava desempregado havia tanto tempo que tinha se esquecido de quando deixara o último trabalho. Na fila, enquanto esperava o ônibus, para mais uma segunda-feira de tentativa de arrumar emprego, viu uma mulher vendendo rifa para a colega. De repente, a idéia iluminou-lhe a mente. "É isto mesmo. Já sei como faturar algum dinheiro."

Chegando em casa, contou a novidade para a mulher. Idalícia não gostou nenhum pouco. Imagine rifar o aparelho de som para conseguir algum dinheiro. Ela tentou dissuadir o marido da bobagem. Disse a ele que o trabalho dela como diarista três dias por semana dava para os três comer. O pequeno Richard Johnson, de sete anos, também concordou.

Mas não adiantou. Erinaldo, resoluto, comprou cartela com cinqüenta pares de números para rifar o aparelho de som pela loteria federal. Escolheu a extração para dali a dois meses, tempo suficiente para ele vender todos os pares de número.

O tempo foi passando, passando...Faltava uma semana para o sorteio da loteria e ele ainda tinha catorze pares de números para vender. Somando a quantidade já vendida, o valor não chegava nem a um quarto do que ele imaginava obter. O número de gente que comprou fiado era enorme. Sem contar que já gastara quase tudo em, nem sabia o quê.

Para não passar vergonha, resolveu preencher ele mesmo os pares de números faltantes. Mas tomou o cuidado de não escrever seu próprio nome. Pois, se ele mesmo ganhasse, todos iriam achar marmelada. Escolheu nomes de parentes, alguns distantes, que ninguém no bairro conhecia.

OTÁVIO NUNES É JORNALISTA

No dia da extração, conferiu o nome do ganhador. Era sua irmã do Parque São Rafael. Havia escrito o nome dela sem aos menos avisá-la. Neste caso, pensou Erinaldo, o aparelho de som ficaria consigo mesmo.

Algumas semanas depois, começaram a correr boatos pela rua. Intrigados, os vizinhos achavam estranho o som ter sido rifado e mesmo assim ainda continuar na casa do Erinaldo, que passou a ser tachado de malandro, oportunista.

Preocupado, ele resolveu consertar o equívoco. Quando ligou para a irmã, seu cunhado, o Armando Botti, atendeu e ficou feliz em saber que havia ganho um aparelho de som na rifa. Aconteceu o que Erinaldo temia. Seu cunhado era um caloteiro contumaz, daqueles que não pagam nem promessa pela vida da mãe. Mesmo assim, Erinaldo pediu que ele ao menos quitasse o valor da rifa.

No dia seguinte, Armando Botti, mulher, cinco filhos e mais um amigo, o dono do carro, estiveram na casa de Erinaldo, onde passaram o dia todo, almoçaram, jantaram e tomaram muita cerveja. À noitinha, foram embora levando o aparelho de som. Assim que o carro estava saindo, Erinaldo escutou a voz do cunhado. “Valeu! Assim que puder, te pago.” (ON)


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