quinta-feira, 10 de setembro de 2015

CLÓVIS CAMPÊLO

Fotografia de Clóvis Campêlo / 2015


O PASSARINHO

(Por Clóvis Campêlo) E mais uma vez, vejo-me indo ao dicionário e à Wikipédia pesquisar uma palavra para mim desconhecida até então.

Segundo o Minidicionário Escolar da Língua Portuguesa, da Companhia Melhoramentos, a palavra pináculo significa o ponto mais elevado de um edifício, monte, etc. Ou seja, a cúpula.

Essa necessidade me veio à baila, depois de receber de um amigo arquiteto, um e-mail em resposta à fotografia acima. Passando a régua, reclamava ele que o passarinho fotografado confundia-se com o pináculo do edifício, talvez numa crítica implícita à qualidade questionável da fotografia. Argumentei em resposta que a fotografia fora feita em condições precárias, aproveitando o momento da composição, o que, guardadas as devidas proporções, Cartier-Bresson chamava de “momento decisivo”, com um equipamento de pequeno porte e em condições não muito adequadas de luz. Ou seja, o momento se ofereceu e eu não tive como recusá-lo. O passarinho, na verdade um bem-te-vi, ainda segundo o dicionário, uma ave do campo que se alimenta de insetos, fez um pouso delicado no tal do pináculo, com uma graciosidade surpreendente e vali-me do que tinha nas mãos para realizar o registro. Parece que isso não o sensibilizou.

Em contrapartida, outra amiga, advogada, data vênia, que se encontra na Suíça visitando a filha que mora lá, elogiou a cena, taxando-a de lindíssima. Ou seja, cabe a nós, autores, decifrar esses retornos e fazer a média adequada.

Eu, particularmente, como autor da fotografia, não a acho perfeita, embora a considere uma fotografia bonita e interessante. O enquadramento centralizado, tradicional, talvez tenha lhe diminuído a ousadia. E além do mais, o que estaria uma ave do campo fazendo no ambiente hostil da cidade grande? Sobre bem-te-vis, aliás, sei muito pouco. Apenas lhes admiro a bravura de colocar gaviões e carcarás, aves muito maiores, em disparada. Talvez, como o Recife ainda seja uma cidade muito arborizada, encontrem fartura alimentar. Mas, na verdade, como se pode verificar pela imagem acima, ele parecia muito à vontade nesse cenário de pedra. Deixou-se fotografar, deu-me uma encarada e, pleno de liberdade, voltou a ensaiar o seu voo. Eu, satisfeito, também segui o meu caminho.

CLÓVIS CAMPÊLO


Na Wikipédia, dissipo a minha ignorância em relação ao passarinho que me serviu de modelo, e descubro tudo isso: “O bem-te-vi é uma ave passeriforme da família dos tiranídeos de nome científico pitangus sulphuratus. A espécie é, ainda, conhecida pelos índios como pituã, pitaguáou puintaguá. Medindo cerca de 23,5 centímetros, caracteriza-se principalmente pela coloração amarela viva no ventre e uma listra branca no alto da cabeça, além do canto que nomeia o animal. Considerado um dos pássaros mais populares do Brasil, é um dos primeiros a vocalizarem ao amanhecer”.

Pronto. Nada como uma boa dose de informações enciclopédicas para nos ajudar a complementar uma crônica que insiste em travar.

Quanto à fotografia em si, retrata o bem-te-vi e uma parte do cenário verticalizado do Recife. O pináculo, que já deve ter servido de ponto de apoio e escala para pássaros diversos, continuará encimando a Igreja da Madre de Deus, no Recife Antigo. E nós, eu e o passarinho, continuaremos dando curso à nossa trajetória nessa terra de Deus, até que a morte nos separe.


Recife, setembro 2015

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