Foto: Arquivo Google |
Jornalista em fim de carreira, vivendo de bicos, Ananias é sujeito
de hábitos prosaicos. Nem poderia ser diferente. Sempre trabalhou muito, sempre
ganhou pouco. Seu único lazer, fora as leituras, é tomar um aperitivo em
botecos populares. O dinheiro é curto. Mas não reclama, até gosta de conviver
com pessoas simples, para não se desgarrar do mundo real. É seu lado repórter a
desassossegá-lo. A desgraça é que, frequentemente, tem que mudar de bar. E
sempre pelas mesmas razões. Ninguém suporta ser motivo de chacota. Nem Ananias,
o resignado..
No início, os novos amigos lhe fazem festa. Apresentar-se como
jornalista é coisa que costuma causar certo frisson
na maioria das rodas. Mas, logo, logo, a admiração inicial, que beira a
vassalagem, é substituída pelas gozações. É questão de semanas. Logo, logo, a
porta do inferno estará aberta. É sempre assim.
“A” quer saber se ele já entrevistou Obama. “B” não se conforma que
ele não tenha tido um encontro sequer com Fidel. Não adianta explicar que sua
área é outra. “C” e “D” acham um absurdo que ele não saiba de cor e salteado os
nomes dos mais de 5.000 municípios do país. “E” vai à loucura, quando ele
admite não ter respostas para solucionar o trânsito de São Paulo nem para
acabar com a corrupção no Brasil. E a coisa vai num crescer. Até que “X”, “Y” e
“Z” lhe perguntam com a franqueza dos ignaros tocados pela uca: “Mas, que porra
de jornalista é você? Onde comprou o diploma?”
Hora de mudar de boteco. Jornalista sofre. Ananias não foge à regra.
(Orlando Silveira - Atualizado em novembro de 2018)
(Orlando Silveira - Atualizado em novembro de 2018)
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