Ilustração: Depositphotos |
Chico Pança é figura manjada na Vila Invernada
e adjacências. Quando está sóbrio – situação para lá de incomum –, ele ainda se
esforça para parecer civilizado: evita polêmicas, fala em tom de gente, não se
mete em conversa para a qual não foi convidado. Após a terceira dose, porém, dá
vasão a toda aquela ignorância adormecida que lhe garantiu má fama. Aos berros,
chama de imbecis os que têm time diferente do seu. Os que não professam a mesma
crença que a sua – embora seja difícil acreditar que, por trás de tamanha
grosseria, possa haver qualquer resquício de religiosidade – também não escapam
dos xingamentos. Tocado, Chico Pança tem opiniões definitivas sobre tudo e
todos. É insuportável. Para dizer o mínimo. Não há roda de pessoas sensatas que,
ante sua chegada, não se desfaça rapidamente. O problema é que as pessoas
sensatas não são tantas assim.
Naquela tarde de sábado, após bom tempo sem
aparecer no Bar do Carneiro, Chico Pança já chegou mamado. Pediu mais umas e
outras, disse que judeus e muçulmanos são os responsáveis pela desgraça do
mundo, pregou a separação de São Paulo do resto país e enveredou pelo campo da
política, um de seus temas prediletos:
- Sabem por que o país está nessa situação?
Porque vocês votam nesses vagabundos. Eu tenho minha consciência tranquila.
Nunca votei em ninguém. Nunca. Se tivéssemos um presidente macho, o Congresso
já estaria fechado há muito tempo e o Exército, nas ruas.
E passou a perguntar a um e outro em quem
tinham votado nas últimas eleições. Cometeu a insensatez de fazer o mesmo com o
Velho Marinheiro. A resposta veio de pronto:
- Eu votei na puta que o pariu, Chico Pança. Você é
um boçal, nada do que você fala se aproveita. Leve sua ignorância e truculência
para divertir outras freguesias.
Com o apoio de outros fregueses, o dono do
bar instalou o falastrão em seu carro-carroça, que partiu cantando os pneus
carecas.
(Orlando Silveira – atualizado em novembro de 2018)
(Orlando Silveira – atualizado em novembro de 2018)
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