Ilustração: Depositphotos |
Maria entrou em casa pisando duro, com cara de nenhum amigo,
soltando faíscas, resmungando impropérios. Zé pressentiu que ia sobrar para
ele. E sobrou. Sem novidade, sempre sobra.
-- O que aconteceu, Maria?
-- O de sempre. Zé, eu estou cheia de você. Cheia. Esgotada. Você só
me faz passar vergonha nesta vida desgraçada que levo.
-- O que eu lhe fiz dessa vez, mulher?
-- Quando souberam, no salão, que fiz aniversário ontem, todo mundo
quis saber se você tinha me levado para jantar fora, que presente você me deu,
essas coisas. Menti. Disse às moças que ganhei uma bolsa lindíssima e que
deixamos o jantar para sábado, que ontem estava indisposta etc. Não sei se
colou. Nós, mulheres, temos o tal do sexto sentido, se me entende...
-- Pelo amor de Deus, Maria, não seja injusta. Há anos, você não
quer que eu lhe compre presente algum. Você não cansa de repetir que eu não sei
fazer compras, erro sempre no tamanho da roupa, tenho gosto duvidoso e sei lá mais o
quê. Além disso, estamos numa situação complicada. O dinheiro da poupança está
no fim, eu não consigo emprego. O que você quer que eu faça? Anteontem, você
ainda me disse: “Não me traga nada, por favor. O mar não está pra peixe.”
Lembra?
-- Francamente. Você é um obtuso em tempo integral. Leva tudo ao pé da letra. Mas quem
sofre as humilhações sou eu.
-- Maria...
-- Vá se catar, Zé.
(ORLANDO SILVEIRA –
ATUALIZADO EM AGOSTO DE 2018)
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Boas amizades são urdidas na quietude. Ser amigo não é bisbilhotar a vida do outro, querer que o outro lhe conte o que ele não quer contar. Há tempo para tudo: para discutir coisas sérias, para contar piadas, para assuntar besteiras, para, eventualmente, desabafar... Por Orlando Silveira
https://orlandosilveira1956.blogspot.com/2018/08/o-mar-ensina.html#comment-form
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