terça-feira, 23 de setembro de 2014

CLÓVIS CAMPÊLO

O NOSSO FUTEBOL


Leonidas da Silva, Friedenreich e Pelé

O futebol surgiu no Brasil, no século XIX, como a nova mania esportiva das classes mais privilegiadas. Os filhos burgueses da pátria mãe gentil aprenderam-no e o trouxeram da Europa pré-modernista daquela época. A sua prática era cara, já que todo o equipamento necessário era importado. Do mesmo modo, necessitava-se de áreas relativamente grandes para a sua prática, embora esse problema fosse facilmente contornável, haja vista que as nossas cidades e capitais dispunham de campos e terrenos baldios a granel.

Incorporado pela classe média brasileira e, posteriormente, pela classe operária e pelo lúmpen-proletariado, logo se transformaria em uma grande paixão nacional. Ao se desgarrar dos burgueses brancos e de cintura dura que o trouxeram do Primeiro Mundo, caiu nas garras da rafaméia do lado de cá, misturando-se aos negros e descendentes de índios, escurecendo a cor da sua pele e adquirindo um jogo de cintura e uma leveza até então desconhecidos pelo lado de lá. Foi a plebeização do futebol no Brasil que o salvou do lugar-comum e da mesmice bizarra dos europeus.

Não é a toa, portanto, que um dos nossos primeiros grandes jogadores fosse filho de um comerciante alemão com uma lavadeira negra. Seu nome, Friedenreich. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1892, apenas dois anos antes de Charles Müller introduzir o futebol no Brasil. O apelido de El Tigre foi-lhe dado pelos uruguaios após o Brasil conquistar o Campeonato Sul-Americano (atual Copa América) de 1919. Apesar de ter sido considerado pela imprensa da sua época como um dos melhores centro-avantes do mundo, morreu pobre, em 6 de setembro de 1969, morando numa casa cedida pelo São Paulo Futebol Clube.

CLÓVIS CAMPÊLO

Entre nós, pernambucanos, nenhum jogador foi tão cantado e decantado quanto Tará. Em 1931, com apenas 16 anos, ajudou o Santa Cruz a ganhar o seu primeiro campeonato estadual. Com ele, chegamos ao tri, em 1932/33. Mas foi no Clube Náutico Capibaribe, em 1943, que se consolidou como goleador ao marcar dez gols em um único jogo, na goleada do Náutico sobre o extinto Flamengo pernambucano por 21 x 3. O Flamengo do Tenente Colares, primeiro campeão estadual de futebol, em 1915, em decadência, terminaria por se transformar em um saco de pancadas do futebol pernambucano. O mulato Tará, soldado da Polícia Militar de Pernambuco e oriundo dos bairros da periferia do Recife, foi o primeiro grande ídolo do futebol pernambucano.

Poderíamos até perguntar se não tivesse acontecido a proletarização e a miscigenação do futebol brasileiro, se teríamos chegado ao pentacampeonato mundial de futebol e transformado o nosso sentimento de inferioridade étnica em um sentimento de superação e conquistas. A própria seleção brasileira de futebol é um exemplo a ser citado, haja vista que com Pelé e Garrincha juntos em campo nunca chegou a ser derrotada.

Recife, setembro 2014


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