sexta-feira, 29 de agosto de 2014

FILHOS, MAMÃE PERDEU O TRONO

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Tempos difíceis, os nossos. Como nunca antes neste país, a lei da oferta e da procura mostra suas garras. É mais fácil acertar no jogo do bicho que encontrar uma empregada doméstica para chamar de sua.  Nem falo das diaristas. Moscas raras. Quando você consegue uma, ainda que a dita seja de uma incompetência a toda prova, é melhor engolir sapos, fingir que não viu nada de errado, fazer de conta que é surdo, concordar com tudo o que ela diz. Melhor não contrariá-la. A não ser, claro, que você se disponha a pegar no escovão. E a encarar o bico de sua mulher, a outrora rainha do lar: “Por conta de seu gênio, diarista nenhuma para em casa!”

Que gênio? Dita nunca chegou no horário combinado. Jamais reclamei. Dita ouvia o rádio no último volume. Jamais dei um pio. Quebrar louças era com Dita mesmo. Eu me limitava a lhe dizer: “Não esquenta, isso acontece.” Dita vivia grudada no celular. Dita reclamava da comida e só bebia água mineral. E eu calado, bebendo água do tal de volume morto. Dita não limpava direito. Eu dava os retoques. Tudo para não chateá-la. Até o dia em que Dita me tirou do sério.

Trabalho em casa. Fui à portaria buscar umas encomendas. Quando retornei, me deparei com Dita sentada na frente do computador corrigindo meu texto. Antes que falasse alguma coisa, ela disparou:

-- Não gostei do título. Vou mudá-lo. O texto também está muito longo. Vou enxugá-lo.

-- Como?

-- É. Vou dar um trato no texto, colocá-lo de pé. Porra, eu preciso desenhar? Está ruinzinho que só. Limpe a janela de seu quarto, se não vou me atrasar. Preciso sair no horário.

Aturdido com tamanha insolência, cheguei a pegar o pano e o vidro de álcool. Preferi mandar a Dita embora. A patroa não me perdoa até hoje: “Este seu gênio... Agora, onde vamos arrumar uma diarista tão boa quanto Dita?” (dezembro de 2012)

 




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