A AUTORIDADE
(Por
Violante Pimentel) Há
anos, numa cidade do interior do Estado do Rio Grande do Norte, um antigo
Delegado de Polícia encaminhou um Ofício ao Juiz de Direito, recém-chegado
àquela Comarca, fornecendo-lhe informações que lhe haviam sido requeridas.
O tratamento usado pelo
delegado foi, simplesmente, “Senhor Juiz”. O Magistrado, acostumado a ser
tratado por "Excelência", não gostou do tratamento e devolveu
imediatamente o Ofício ao Delegado, para que fosse retificado o
"equívoco". Sentiu-se ferido nos seus brios, considerando-se ofendido
pela autoridade policial. Afinal, o tratamento dispensado ao ocupante desse importante
cargo público sempre foi "Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz de
Direito".
O Juiz devolveu o
Ofício ao Delegado, repreendendo-o e advertindo-o das possíveis consequências
que poderiam resultar daquilo que ele considerava um desrespeito à autoridade.
Nessa época, ainda não
havia a exigência legal do Delegado de Polícia Estadual ser Bacharel em
Direito. O Delegado do interior, quase sempre, era um policial antigo e rude,
sem interesse de agradar a ninguém. Geralmente, estava perto de ser transferido
para a Reserva Remunerada. Sendo uma das autoridades da cidade, o delegado
sentia-se no mesmo patamar do Juiz, do Promotor e do Padre.
Ao receber a devolução
do seu Ofício, com a repreensão do Juiz, o velho Delegado ficou revoltado.
Ignorante ao extremo, a autoridade policial não gostou do "carão" que
recebeu, e, sem medir as consequências do seu ato, encaminhou outro Ofício ao
Magistrado, onde dizia:
“Senhor Juiz:
Deus, que é Deus, eu
trato de “Senhor Deus”, e ele nunca reclamou. Por que o senhor, que é apenas um
Juiz do interior, quer ser mais importante do que Deus? O senhor, pra mim, é
igual a um Juiz de futebol ou a um Juiz de briga de galo. É um homem igual aos
outros. Come, defeca e urina, e deve ter também muita flatulência. E ainda quer
ser maior do que Deus, Nosso Senhor!!! Não tenho medo de suas ameaças!
Pra mim, maior do que
Deus, ninguém!
Pode chover canivete e
nem que a vaca tussa, eu não vou mudar o que escrevi! Eu também sou autoridade,
Senhor Juiz!"
Indignado com a afronta
do velho Delegado, o Juiz tomou as devidas providências para destituí-lo do
cargo, e processá-lo administrativamente, por desacato à autoridade.
Violante
Pimentel é procuradora aposentada do Estado do Rio Grande do Norte.
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