![]() |
LOBATO: A BURRICE QUER BANI-LO DAS ESCOLAS |
POLITICAMENTE
CORRETO
OU
POLITICAMENTE IRADO?
Os
livros de Monteiro Lobato foram fundamentais
para
minha formação. Nem por isso virei racista
POR WALCYR
CARRASCO
ÉPOCA
DIGITAL – 28/02/2017
O
que era um movimento interessante, de respeito a minorias, tornou-se ridículo.
Falo do politicamente correto, uma forma de opressão descoberta por gente que
pretende parecer legal. Mas que quer mesmo mandar nos outros. O cúmulo do
ridículo foi neste Carnaval, com a polêmica em torno das marchinhas,
principalmente “Cabeleira do Zezé” e “Maria Sapatão”. São cantadas há décadas
e, em minha opinião, nunca causaram mal a ninguém. De repente, a crítica. A
primeira seria preconceituosa em relação aos homens homossexuais. A segunda, às
mulheres homossexuais.
Um
argumento contra essas marchinhas se baseia na diferença entre orientação
sexual e identidade de gênero. Ou seja, uma pessoa pode fisicamente assumir um
sexo diferente daquele com que nasceu. Mas isso não vai, necessariamente,
determinar por quem sente atração. Simplificando: alguém nascido num corpo de
homem pode se sentir fora do corpo certo. Se mudar de gênero, pode continuar
tendo atração por mulheres, por que não? Há casos assim, em todo o mundo. A
marchinha “Maria Sapatão” seria, de acordo com alguns, preconceituosa por mexer
com o gênero. Ora, façam-me o favor! Tudo acaba proibido. A dupla intenção é um
dos esteios da arte, seja marchinha considerada arte ou não. Antes foi a vez de
“O teu cabelo não nega”, acusada de propagar o racismo.
Já
li uma versão de contos de fadas politicamente corretos. Reescritos, óbvio. Não
há nada mais incorreto que esses contos deliciosos em que João e Maria atiram a
Bruxa dentro do forno e Chapeuzinho Vermelho é devorada pelo Lobo. Na versão
higienicamente recontada, até o Lobo ficou bacana. Odiei. Quem conhece a
psicologia dos contos de fadas sabe que auxiliam a criança a lidar com seus
sentimentos, inclusive de agressividade. Sou apaixonado por eles. Será que
algum dia vão proibir edições antigas? De Monteiro Lobato, nem se fala. É o
maior escritor infantil brasileiro. Devagarzinho, está sumindo das escolas. É
acusado de racismo. A boneca Emília, de fato, trata Tia Anastácia, a empregada,
de “negra beiçuda”. Lobato escreveu em um contexto histórico.
Não
seria mais rico auxiliar as professoras a explicar esse contexto aos alunos,
demonstrar como o respeito ao negro cresceu ao longo dos anos, explicar as leis
antirracismo? Mais fácil esconder Lobato, que me formou com seus livros. Nem
por isso sou racista, posso dizer de boca cheia. Fui o primeiro autor no mundo
a colocar uma protagonista negra em novela de televisão: Xica da Silva, que lançou a maravilhosa Taís Araújo na extinta TV
Manchete, há 20 anos. Nem por isso consegui respeito. Quando escrevi A Padroeira, na Globo, falando sobre
Nossa Senhora Aparecida, mostrei negros escravizados. Um expoente do movimento
negro quis me processar. Lembrei:
–
É um fato histórico. Vocês deviam denunciar a escravidão todo o tempo, foi o
grande holocausto negro.
–
Seria mais bonito você escrever sobre negros que superaram suas condições e
ficaram famosos – foi a resposta.
A
réplica dele não foi ruim. Mas o holocausto existiu. Pode ser escondido? Julgam
politicamente correto. Assim como a palavra “mulata”, superincorporada ao
vocabulário, que agora está no índex das proibidas.
Escrever
para o grande público é correr o risco de ser linchado sempre pelo
politicamente irado. Outro dia estava no aeroporto. Fui ao banheiro. Lá estava,
numa portinha: “Para pessoas de baixa estatura”. Correto. A palavra anão é
proibida pelo politicamente chato. Por que, não sei. Trocar o modo de falar
aumenta a estatura? Não aumenta. Falar em afrodescendente muda o tom da pele?
Não muda. O que muda é a maneira como se fala. O contexto em que a frase é
usada, seu significado maior. A patrulha do politicamente chato só atrapalha,
porque as coisas continuam como são.
A
portinha do toalete me fez pensar. Entre as protagonistas de minha próxima
novela há uma anã. Desculpem-me, uma jovem de baixa estatura. Mas, na
história, a própria mãe não gosta dela. Para denunciar o que essas pessoas
passam – inclusive a falta de banheiros adaptados em restaurantes – tenho de
mostrar a parte ruim. Senão, escreverei um conto de fadas falso, como aquele em
que Chapeuzinho fica amiga do Lobo.
Muito
bem, podem me apedrejar. Vou falar de tudo isso sim, incluindo preconceito
racial. Não vou maquiar a realidade como o politicamente burro faz. É
levantando os problemas que se constrói uma nova visão. Não pulo Carnaval. Mas
adoraria ter entrado num bloco só para cantar “Olha a cabeleira do Zezé”.
TALVEZ VOCÊ GOSTE DE LER
***
TALVEZ VOCÊ GOSTE DE LER
UM HOMEM, QUATRO COPOS
Levei
uns dias, talvez semanas, para perceber os detalhes do ritual: um
homem, quatro copos, dois palitos, um pedaço de pizza. De segunda à
sexta, sempre no mesmo horário, por volta das 18horas... Por Orlando
Silveira
Nenhum comentário:
Postar um comentário