quarta-feira, 11 de maio de 2016

QUASE HISTÓRIAS (LXXVIII)

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NEM TODA MENTIRA SERÁ CASTIGADA

Dizem que mentira é coisa feia e tem pernas curtas. Não é bem assim. Todos nós conhecemos pessoas que mentem compulsivamente – e que vão longe. Não faz tanto tempo, um mitômano chegou à presidência da República. Outros tantos, ainda que não saibam uma palavra em javanês, prosperam igual e celeremente – vendendo aos incautos os conhecimentos que não têm de javanês.

Sejamos francos: em certas situações, não há como fugir da mentira, daquela mentirinha que as pessoas sem senso de ridículo nos obrigam a contar. Imagine sua sogra, que já atravessou os limites da obesidade mórbida, dirigindo-se a você, Juninho, com aquele corpanzil roliço coberto por um vestido estampado, com flores e cores variadas, verdadeiro escândalo:

— Então, Juninho, sua sogra está ou não está elegante, bonitona?

Refreie seus instintos mais primitivos. Sinceridade, ao contrário do que dizem, nem sempre é boa conselheira. Tudo o que você, Juninho, disser aquém de “claro, claro” soará aos ouvidos de sua sogra como ofensa irreparável. Minta, mas seja discreto. Nada de elogios rasgados. Ela sabe que, com o “claro, claro”, você está mentindo. Ela não é tola de tudo. Jamais suportaria, no entanto, o deboche. Nada de “bonitona é pouco” ou mesuras afins.

A desgraça é que há pessoas que mentem sem necessidade alguma. Deveriam ficar caladas. Seja honesto: sem contar seus filhos, evidentemente, você já viu algum recém-nascido lindo, que seja de fato a cara do pai, da mãe ou do vizinho? O que temos ali, após o parto, é uma massa disforme que leva obstetras em início de carreira a ter uma dúvida das bravas: afinal, qual é a placenta?

Os extremos se tocam. Velórios são também espaços propícios para mentiras desnecessárias. Ora, todo mundo sabe que o cara foi um crápula a vida toda, teve casos e mais casos, bebia e fumava sem descontinuar, fugia do batente como aquele presidente dos livros etc. e tal. Aí, sempre aparece alguém para dizer, com ares de carpideira, para a pobre da viúva – justo para ela, que agora sonha com um fim de vida sereno: “Foi um homem bom, ninguém pode negar”.


Resumo da ópera: minta, mas não exagere. (2013)

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