Foto: Arquivo Google |
Jurubeba – o morador de rua mais famoso de Vila Invernada – parou na porta do bar do Carneiro. Não disse palavra. Nem precisava. Seus olhos embotados suplicavam por cachaça. É como se rogassem: “Uma dose por Deus”.
Encostado no balcão, Chico Pança, cujos olhos estavam tão embotados
quanto os de Jurubeba, desandou a falar – aos berros, evidentemente, porque a ignorância é sempre estridente - para que
todos o ouvissem:
-- Quer comer uma coxinha? Eu pago. Quer um doce? Eu pago. Agora, só
não dou dinheiro nem pago cachaça pra pinguço. Isso eu não faço.
O Velho Marinheiro levantou-se da cadeira, foi até o balcão e pediu ao dono do bar que pegasse um copo descartável e o enchesse de aguardente até a boca. Fez-se silêncio. Então, foi até a porta e entregou o copo cheio a Jurubeba, junto com uma nota de cinco reais. Retornou para a mesa e tentou retomar o papo com Ananias, seu amigo.
Chico Pança resolveu cutucar a fera com varinha de condão:
-- É por isso que pinguço não se emenda. Tem sempre um otário...
Não teve tempo de concluir sua fala despropositada.
-- Escuta aqui, vagabundo: o dinheiro é meu, faço dele o que quero.
Quem precisa de pinga para ficar em pé não quer saber de coxinha. Nem consegue comê-la. Não desce. E você o que
é? Um bêbado ordinário que ainda tem casa pra morar. Jurubeba precisa mesmo é de
tratamento. Você vai pagar, vai? Você é um ignorante incorrigível, Chico. Pega
sua coxinha e enfia no rabo, junto com seu moralismo safado. E tem mais: se
você humilhar Jurubeba de novo, eu lhe soco a cara. Espero nunca vê-lo dormindo
na rua, totalmente dominado pelo vício. Cuide-se, Chico. Porque jamais lhe pagarei uma
cachaça nem lhe darei uma moeda sequer. Mas lhe garantirei – tenha certeza – uma
coxinha e um doce de bar. (OS - Atualizado em março de 2019)
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