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O Velho Marinheiro estava visivelmente irritado. Desde que chegou ao bar do Carneiro, quase uma hora atrás, não trocou palavra com ninguém. Sentado à mesma mesa, Ananias permaneceu o tempo todo em silêncio absoluto. Sabia que seu amigo estava louco para desabafar, mas não seria ele quem puxaria prosa.
-- Está calado por que Ananias?
-- Acho que o senhor não está a fim de conversar. Respeito seu
desejo de ficar quieto.
-- Ananias, a verdade é que família, às vezes, torra a paciência.
Desde sábado, Mafalda e Irene não falam comigo. Estão com um bico desse
tamanho. Mas a culpa, no fundo, é minha. Não devia ter cedido. Quem mandou
querer agradar a neta?
-- Posso saber o que houve?
-- Irene me pediu para emprestar o salão de festas de minha casa
para que uma amiga sua fizesse ali uma festinha de aniversário para a filha,
criança de cinco anos. Não viriam mais de cinquenta pessoas. Apareceram mais de
cem. Gente medonha.
-- O pessoal abusa. Diz uma coisa e faz outra. Sei como é, entendo o senhor.
-- O problema maior nem foi o número de convidados. Ia tudo mais ou
menos bem, noves fora o fato de ter pegado duas velhas gaiatas usando o banheiro
da suíte e um bêbado tirando pestana no meu sofá. . Que ousadia! Agora, na hora de cantar parabéns a você, o caldo
entornou.
-- O que aconteceu?
-- O pai da criança, completamente bêbado, na hora de cantar parabéns,
começou a gritar: “É pica”, “É pau”, “É rola”. A turba pegou fogo.
-- E o que o senhor fez?
-- O que tinha que ser feito. Peguei o safado pela orelha e o
coloquei para fora de casa. Voltei para o salão e anunciei uma única vez: “A
festa acabou. A saída é por ali. Tenham todos vocês uma péssima noite!” Foi
isso, apenas isso. Mafalda, minha mulher, ainda teve a ousadia de me dizer que
implico com qualquer coisa, que sou exagerado...
-- Será que o senhor ouviu bem?
-- Ananias, Mafalda é completamente surda e perdeu na semana passada
o aparelho. Meu caro: não sou puritano, também falo palavrões, mas nunca na
frente de mulheres e crianças, menos ainda aos berros e na casa dos outros. Que
Mafalda e Irene fiquem de bico! Só tenho uma certeza: nunca mais vão me pedir
para emprestar o salão para ninguém. Vamos tomar uma cerveja. Bando de safados. Antes que me esqueça: lá em casa só tem uma surda: Mafalda. (OS - Atualizado em setembro de 2018)
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