quarta-feira, 14 de maio de 2014

OS ÓCULOS DA LEONOR

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 Era um sujeito divertido, meio amalucado, pai de um grande amigo meu de juventude. Baiano dos que falam pelos cotovelos, tinha quase 50 anos. Profissão: dentista. Seu forte não era tratar canais nem fazer próteses. Segundo diziam no prédio em que todos nós morávamos, sua especialidade era vender atestados médicos. Gostava de fazer feira, mas tinha o péssimo hábito de esquecer mercadorias, peixe inclusive, no porta-malas do carro. Ou seja: era rara a semana em que a fedentina não tomava conta da garagem.

Uma noite, perto das 23h, passei em seu apartamento. Queria saber se meu amigo, seu irmão e mãe, já haviam retornado da viagem à Bahia. Ele ficou feliz com minha presença, disse que chegariam naquela madrugada, me convidou para ir com ele até a rodoviária. Topei. Pra minha surpresa, pegou o sentido contrário, rumo a Penha. “Não se preocupe. É que tenho que resolver um probleminha, coisa rápida. Dá tempo de sobra. O ônibus sempre atrasa”.

Parou o carro em frente uma casa de classe média, pediu que eu esperasse um pouco, vinha logo. Não me restava fazer outra coisa: esperei. Do lado de fora, ouvi um bate-boca. Não demorou muito, ele saiu, ligou o carro e partimos para a rodoviária. Sem que eu nada lhe perguntasse, me mostrou uns óculos:

-- É da Leonor. Sem óculos, ela não enxerga nada, não consegue dar aula. Peguei sem ela ver. Amanhã, ela me liga. E a gente reata.


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