sábado, 30 de junho de 2018

A ÉTICA DO CRUZ-CREDO: O VENDEDOR DE ATESTADOS

Resultado de imagem para ILUSTRAÇÃO PARA MÉDICO ASSINANDO ATESTADO MÉDICO
Foto: Arquivo Google
Em pouco tempo, Paulinho, perdão doutor Paulo Gonzalez, enricou. Aprovado num concurso público promovido pela Prefeitura, ele se mudou para uma cidade de porte médio. Meses depois, montou o próprio consultório. Logo em seguida, também passou num concurso público do governo do Estado, para trabalhar no mesmo município. Só os profissionais que atuam na área da Saúde e Educação, como se sabe, podem ter simultaneamente dois empregos públicos. No começo, Paulinho, como o chamam familiares e amigos de adolescência, ralou uma barbaridade. Não tinha tempo para nada. Sua vida era só trabalhar, trabalhar, trabalhar.

Com o passar dos meses, Paulinho resolveu dar ouvidos aos colegas mais experientes. Cansado de dar murros em ponta de faca, passou a marcar o ponto de entrada e o de saída nos dois empregos públicos. Nesse meio tempo, ia cuidar da vida. Pedia às secretárias para que concentrassem as consultas em um ou dois dias da semana, no máximo.  Passava boa parte do tempo em seu consultório particular. Em caso de emergência, lhe avisavam pelo WhatsApp – e ele ia de moto, zunindo, para seu posto de trabalho. Que o paciente esperasse um pouco. Ora, ninguém morre de véspera.

Mas o consultório, por mais que Paulinho ali permanecesse, por mais que distribuísse cartões e fizesse propaganda nos jornais locais, cambaleava. Clientela miúda. As consultas, raras, mal davam para pagar as despesas. Novamente, o doutor deu ouvidos aos colegas mais experientes. Deixou de lado a veleidade de ser um grande médico, sonho da família e dele próprio, e passou a vender atestados. Hoje, dá gosto de ver aquela movimentação. Um entra e sai de gente que não cessa, de segunda a sexta. A demanda é tanta que Paulinho resolveu dar um passo além. Deixa uma série de atestados já carimbados e assinados. Um funcionário de sua confiança, vestido de branco, encarrega-se de receber o dinheiro em troca do papelucho carimbado e assinado por Paulinho, perdão, por doutor Paulo Gonzalez.

Orlando Silveira
Junho de 2018

***

LEIA TAMBÉM: A MERENDEIRA

Motoristas de ônibus podem fazer greve que ela não está nem aí. Vai a pé. E nunca volta de mão abanando. Por Orlando Silveira
https://orlandosilveira1956.blogspot.com/2018/06/a-etica-do-cruz-credo-merendeira.html#comment-form

Nenhum comentário:

Postar um comentário