“EDUCADOR” BARBOSA
O
misto de carcereiro e diretor pedagógico do colégio do qual era sócio não teve
dúvidas – como sempre, foi carcereiro. Chamou o professor novato, moço
esforçado à caça de tostões, e foi direto ao assunto:
--
Professor, e agora? Como vamos sair da enrascada em que o senhor nos enfiou?
Diga.
O
professor, temeroso de perder o bico, não se fez de morto, estava morto:
-- O
que fiz? – “Educador” Barbosa.
Aí
de quem o chamasse de Barbosa, sem o “Educador” na frente.
--
Não me venha com cinismo. Sou vivido demais, pra suportar abusado. O senhor
distribuiu zero, um, dois e três (a melhor nota), para todos. E agora? Como
vamos fazer para passar todo mundo de semestre?
--
Eles não têm condição de passar. São malandros e analfabetos.
--
Professor, nossa escola, especializada em cursos supletivos, tem como lema o
slogan daquela rede de lojas famosa: “Sua satisfação garantida ou seu dinheiro
de volta.” Dê um trabalho pra eles. Não perca tempo com correção. A nota? A da
precisão de cada um. Aqui, não devolvemos dinheiro, mas entregamos o combinado:
diplomas. É simples assim. Vire-se. Só reprovamos os inadimplentes. Preciso
desenhar?
***
Dublê
de diretor pedagógico e carcereiro, “Educador” Barbosa (ai de quem não o
chamasse assim), cultivava apreço especial pela uca. Também não desconsiderava
os cigarros, que fumava sem descontinuar, alternando os de palha com os
industrializados. Pagava pra ver até aonde fígado e pulmões iam. Pagamos caro
pela aventura insana, porque o seguro saúde lhe deixou na mão. Morreu nos
braços do SUS. Ou seja: a conta, como Sílvio Santos, foi coisa nossa.
Nosso
“educador” era adepto ferrenho da disciplina.
Não
se sabe até hoje se levava os conhecimentos pedagógicos que não tinha para o
cárcere, mas ninguém tem dúvidas de que trazia a lei do cárcere para o colégio
supletivo. Inferno. De quando em vez, baixava normas estranhas. E mandava
espalhar cartazes pelos corredores, com as tais das normas estranhas,
“carimbadas” com um sonoro “CUMPRA-SE”.
Ai
de quem não as cumprisse. Ai de quem não colocasse o “Educador” antes do
Barbosa. De “Educador” Barbosa, o jovem professor sempre o chamou. Mas ousou
desrespeitar, num dia, o famigerado “CUMPRA-SE” – que proibia professor de dar
início às aulas sem que todas as carteiras estivessem alinhadas, rigorosamente
alinhadas.
Do
nada, mas em estado natural – ou seja: tocado –, “Educador Barbosa” entrou na
sala. E foi direto ao assunto:
--
Professor: o senhor não cumpre uma ordem minha. Olhe como estão as carteiras.
--
“Educador” Barbosa: ou dou aula, ou levo quarenta minutos esperando que eles
cumpram sua determinação.
Baixou
o espírito carcereiro.
“Educador”
Barbosa levou a mão direita até o fim da espinha, sacou o revólver. Mirou os
alunos, que, de imediato, puseram as carteiras em posição de sentinela.
--
Professor: veja como a vida é fácil. Basta querer. E olhe: só estou brincando.
Se atirasse...
Para
o bem do ensino, encerrava ali a carreira de um professor improvisado. (2013)
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