Ir às lojas Americanas, no centro velho da cidade (já existia o
novo?), uma vez por mês, a cada dois meses, sei lá, era um passeio aguardado
com sofreguidão. A mãe comprava misto quente e batata frita e umas balas
vendidas por quilo -- para minha irmã caçula, para mim também. Que eu saiba nunca
fomos além dos duzentos gramas. Desnecessário explicar.
Como o dinheiro era curto, ela nos pedia um pedacinho do lanche. (Não
sabia que mãe tinha vontade depois do parto.) E o recebia com evidente má
vontade de nossa parte. Crianças são mesquinhas.
Meus olhos babavam de gula ante
aquele mar de confeitos coloridos. Era
um alumbramento.
Mas feliz mesmo eu ficava quando a mãe dava sinal verde para comprar
uns bonequinhos, dois ou três no máximo, para meu forte apache, tão carente de
índios e soldados. Na verdade, meu forte nunca chegou a ser um forte. Quando
muito foi um posto avançado do exército americano. Como aquele de “Dança com
Lobos”.
Mario Quintana escreveu: “Quem vê um fruto pensa logo em furto”.
Sou humano. Fui criança. Pensei no "fruto" e no furto.
Certa feita, minha mãe leu meus pensamentos de estrategista militar
desavergonhado: “Se pegar um bonequinho e pôr no bolso, nunca mais vai usar
estas mãos”. Envergonhado, voltei para meu posto avançado.
Minhas mãos nunca furtaram nada. Mas não posso negar que, na
juventude, foram bobas.
Bons tempos em que minhas mãos eram bobas.
Bons tempos em que minha mãe estava sempre prestes a lhes dar umas
palmadas. Para que não degenerassem. (ATUALIZADO EM MARÇO DE 2018)
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AUTOESTIMA: Se de mim falam o diabo – e falam mesmo –, é porque o diabo é bom. Por Orlando Silveira
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Eu adoro esse seu texto! Já fiz comentário e acho que cada leitura mais deslumbrada eu fico! Delícia de lembranças...e que bom que vc conservou muito desse Orlandinho! E que cada vez que o "adulto balance ele venha lhe dar a mão"! Que mãe inesquecível mesmo!
ResponderExcluirObrigado, Marlene.
ExcluirE depois de crescidinho, hem, Orlandinho? As "mãos bobas" que não eram tão infantis, tornaram-se mais salientes, não foi??? ...rsrsrs...Parabéns pelo excelente texto, meu caro Orlando Silveira!
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