Apesar de ser torcedor do Santa Cruz, o maestro Nélson Ferreira nunca
compôs um hino para o clube do seu coração. Ao contrário, compôs o hino do
bloco Timbu Coroado, troça que no domingo de carnaval desfilava pelas ruas do
bairro dos Aflitos, onde fica a sede do Clube Náutico Capibaribe, além do frevo
“Come e Dorme”, feito em homenagem aos jogadores reservas do clube alvirrubro.
Como se isso não bastasse, em 1955, a pedido de um jovem amigo da época, compôs
o frevo canção “Cazá Cazá Cazá”, em homenagem ao clube da Ilha do Retiro.
Tal situação só foi corrigida em 2008, quando o Maestro Forró, também
torcedor do tricolor do Arruda, utilizando os acordes de uma música inacabada
do maestro Nélson, criou o frevo “Vulcão Tricolor”, saldando a dívida e
satisfazendo e saudando a imensa torcida coral.
Hoje, quando se completa 37 anos da morte do maestro pernambucano,
ocorrida em 1976, essa história irônica nos vem à lembrança. Mas, embora
continue sendo muito mais conhecido como um compositor de frevos, Nélson
Ferreira foi autor de músicas em gêneros e estilos diversos (tangos, canções,
valsas, foxtrotes, etc).
Nascido na cidade de Bonito, no agreste do Estado, em 9 de dezembro de
1902, segundo alguns estudiosos seus, até hoje Nélson Ferreira é um dos
compositores nordestinos com mais músicas gravadas na discografia brasileira,
muito embora a sua fama tenha praticamente se restringido a Pernambuco e ao
Nordeste.
Como músico, tocava violão, violino e piano. No Recife, tocou em bares,
cafés, saraus e cinemas, numa época em que os filmes do cinema mudo eram
acompanhados com música ao vivo.
Como compositor, fez a sua primeira música, a valsa “Vitória”, aos 14
anos, por encomenda. Compôs frevos antológicos, como “Evocação nº 1”, sucesso
no carnaval do Rio de Janeiro em 1957, cantada em ritmo de marchinha
carnavalesca.
Além disso, foi diretor artístico da Rádio Clube de Pernambuco e da
Fábrica de Discos Rozemblit, a única existente fora do eixo Rio-São Paulo nos
anos 50.
Sua fama como compositor de frevos era tão grande que nos anos 70
recebeu do presidente Emílio Garrastazu Médici a condecoração de Oficial da
Ordem do Rio Branco.
Faleceu no Recife, no dia 21 de dezembro de 1976, deixando inacabado um
disco que preparava para o carnaval de 1977.
Hoje, no Recife, em uma pequena pracinha na Rua dos Palmares, no bairro
do Santo Amaro, construída no lugar de uma casa demolida onde o maestro morou,
existe um busto erguido em sua homenagem.
A música pernambucana como um
todo ficou substancialmente mais pobre ao longo do ano de 2013. Ela perdeu
nomes que contribuíram de modo bastante efetivo nas últimas décadas para elevar
o nome e a cultura do estado para o patamar que hoje é possível observá-la nos
mais diversos gêneros que a constitui. No entanto, um gênero em especial, foi o
que mais sentiu a perda de nomes emblemáticos em seu segmento: o forró.
Partiram nomes como Julio Nunes
Pereira, ou melhor, Duda da Passira. Natural de Passira, no Agreste de
Pernambuco, o instrumentista começou a carreira tocando forró pé-de-serra. Com
seis discos e mais de dez CDs gravados, em 1991 foi indicado ao Grammy
internacional na categoria música regional e veio a sucumbir devido a uma
hemorragia digestiva que talvez tenha se agravado devido a diabetes a qual o
músico também sofria; Outro que também partiu ao longo deste ano foi o cantor e
compositor João Silva. Autor de mais de 2000 composições e inúmeros clássicos
interpretados por nomes como Luiz Gonzaga e quase todos os cantores e
intérpretes do gênero, João deixa-nos como legado canções como 'Nem se despediu
de mim', 'Pagode Russo', 'Deixa a tanga voar' entre tantas outras com os
parceiros mais diversos tais quais João do Vale, Onildo Almeida, Rosil Cavalcante,
Severino Ramos, Bastinho Calixto, Pedro Maranguape e Pedro Cruz. Nascido em
Arcoverde, a 259 quilômetros do Recife, João Leocádio da Silva, o João Silva,
foi também um dos responsáveis direto do primeiro disco de ouro de Luiz
Gonzaga, o álbum 'Danado de bom', que vendeu cerca de 1,6 milhão de cópias
vendidas.
Outras lacunas deixadas ao longo
deste ano foram ocasionadas pela partida de dois ases da sanfona. De um lado
Arlindo dos oito baixos, considerado Patrimônio Vivo de Pernambuco. Nascido em
Sirinhaém, Arlindo morou até a adolescência no Engenho Trapiche. Saiu da
cana-de-açúcar para cortar cabelos no Cabo de Santo Agostinho. Foi lá que
começou a tocar sanfona em bailes, instrumento que aprendeu vendo o pai tocar
os Oito Baixos. Foi em um show no Parque de Exposição do Cordeiro que Arlindo
conheceu Luiz Gonzaga. Passou 22 anos tocando com o Rei do Baião. "Ele que
me fez voltar aos oito baixos. Disse que já tinha sanfoneiro demais, mas
ninguém tocava oito baixos. Gravei e na hora de assinar os créditos ele pediu
pra trocar Arlindo do Acordeom por Arlindo dos 8 Baixos", lembrou, em
entrevista pouco antes de morrer. Em mais de 50 anos de carreira, Arlindo
gravou mais de 200 músicas, a maioria instrumental. O outro expressivo nome foi
Dominguinhos, parceiro e discípulo do maior nome do gênero ao qual tão
bravamente defendeu: Luiz Gonzaga. Dominguinhos foi um dos responsáveis não só
pela urbanização do forró mais também por manter viva a chama do ritmo em todo
o país depois da morte do Rei do Baião. Dominguinhos partiu aos 72 anos, no
Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo depois de lutar por cerca de seis anos
contra um câncer de pulmão. Nascido em Garanhuns, no agreste de Pernambuco, o
sanfoneiro conheceu Luiz Gonzaga com 8 anos. Aos 13 anos, morando no Rio, ganhou
a primeira sanfona do Rei do Baião, que três anos mais tarde o consagrou como
herdeiro artístico. “Gonzaga estava divulgando para a imprensa o disco 'Forró
no Escuro' quando ele me apresentou como seu herdeiro artístico aos
repórteres”, lembrava Dominguinhos sempre que questionado sobre o assunto.
Instrumentista, cantor e compositor, o artista ganhou em 2002 o Grammy Latino
com o “CD Chegando de Mansinho”. Ao longo da carreira, fez parcerias de sucesso
com músicos como Gilberto Gil, Chico Buarque, Anastácia, Nando Cordel, Fausto
Nilo e Djavan.
Já o frevo perdeu Carlos Fernando
vítima de complicações causadas por um câncer de próstata. Natural de Caruaru,
o pernambucano foi um dos responsáveis pela renovação do frevo não só em
Pernambuco, mas em todo o país através do projeto "Asas da América" e
a série de discos lançados até meados da década de 1990. Ainda na mesma década
foi responsável pela série Recife Frevoé e nos anos de 2000 foi o produto do
álbum "100 Anos de frevo - É de perder o sapato", em homenagem ao
centenário do ritmo. Carlos, ao lado de outros artistas pernambucanos, também
participou do Movimento de Cultura Popular de Pernambuco - um dos focos da
resistência ao governo militar no estado - ainda na década de 60 e foi autor,
entre diversas composições, de "Banho de Cheiro", eternizada na voz
de Elba Ramalho; "Canta Coração", eternizada por seu parceiro e amigo
Geraldo Azevedo. No currículo, o pernambucano deixa como legado centenas de
canções (boa parte com Geraldo Azevedo) e intérpretes como Caetano Veloso,
Djavan, Chico Buarque, Jackson do Pandeiro e Gilberto Gil.
Não poderia também deixar em
branco o infortúnio que vitimou de modo precoce a produtora japonesa Sanae
Shibata, de 31 anos. Sanae, que morava no Recife há 10 anos e trabalhava como
produtora musical, com trabalhos diversos ligados à valorização da música
pernambucana, foi vítima de um atropelamento de moto.
Nascida em Tóquio, e formada em
Comunicação Social pela Universidade em Tóquio, estudou cultura nordestina na
Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), onde também participou do Programa
de Pós-Graduação em Antropologia. "Desde 2004 trabalho como produtora
cultural, na acessoria entre produtores japoneses e artistas nordestinas",
dizia seu perfil no portal Nação Cultural. A produtora fazia a ponte entre
Pernambuco e Japão, levando discos do Estado para a Terra dos "olhos
puxados" e desde 2007, Shibata trabalhava com patrimônio imaterial, como
pesquisadora de campo para levantamentos pelo Iphan, explorando "Formas de
expressão de Pernambuco e Cocos do Nordeste". A produtora aprendeu a tocar
e fabricar a rabeca, instrumento típico do Cavalo Marinho nordestino, na escola
de luthieria em Ferreiros, na Zona da Mata Pernambucana.
Por fim, a menos de uma semana,
perdemos um dos maiores expoentes do ritmo "brega" que foi Reginaldo
Rossi. Com quase 50 anos de carreira Rossi soube como poucos expor as dores e
lamentos dos traídos nos 31 discos que lançou. Deixa como legado a irreverência
e a imagem peculiar acompanhado por sua cabeleira e seus óculos.
Se de um lado as coisas são
desfavoráveis, por outro este ano foram lançados, até agora, entre CDs, DVDs,
LPs e EPs, mais de 180 títulos de artistas pernambucanos e a Passa Disco,
trincheira de resistência da cultura do estado, chegou a uma década de
existência valorizando de modo cada vez mais constante a cultura de Pernambuco.
Fez açude, estrada de rodagem, carregou água pra casa do homem...fez a
feira e serviu de montaria
O jumento é nosso irmão...
E o homem...
em retribuição o que, que lhe dar?
Castigo...pancada, pau nas pernas, pau no lombo,
Pau no pescoço, pau na cara, nas orelhas.
Ha...jumento é bom o homem é mal
E quando o pobre não agüenta mais o peso
De uma carga, e se deita no chão...
Você pensa que o homem chega ajuda
O bichinho se levantar? Hu...pois sim
Faz é um foguinho debaixo do rabo dele
O jumento é bom...
O jumento é sagrado...o homem é mau.
O homem só presta pra botar apelido no jumento
O pobrezinho tem apelido que não acaba mais
Babau, gangão, breguesso, fofarkichão,
Imagem do cão, musgueiro, corneteiro, seresteiro,
Cineiro...relógio, é....ele dar a hora sertã no sertão
Tudo isso é apelido que o jumento tem...
Astronauta...professor, estudante...
advogado das bestas...
é chamado de estudante, porque quando o estudante não sabe a lição da
escola
o professor grita logo
você não sabe porque você é um jumento
e o estudante pra se vingar boto o apelido
jumento de professor, porque o professor ensina ele de graça...pos
sim, quem ensina ele de graça
é o jumento meu filho...é assim...
A E I O U U
SINONIMO, SINONIMO,
SINONIMO, SINONIMO,
SINONIMO, SINONIMO,
Só não aprende a ler quem não quer
Esse é nosso jumento nosso irmão
Animal sagrado...
Serviu de transporte pro nosso senhor
Quando ele iria para o Egito, quando o nosso senhor era
perritotinho...
Todo jumento tem uma cruz nas costas
Não tem? Pode olhar que tem...
Todo jumento tem uma cruz nas costas
Foi ali que o menino santo fez o pipizinho
Por isso ele é chamado de sagrado
A ha ha...jumento meu irmão,
o maior amigo do sertão
ele é cheio de presepada sim senhor
uma vez ele me fez uma menino,
que eu não me esqueci mais
quando dar as primeiras chuvas no sertão,
agente planta logo um milhozinho
no monturo da casa da gente, porque dar ligeiro
e é milho doce, dar ligeirinho, ligeirinho
o jumento cismou de ser meu sócio
eu disse eu pego ele...
quando ele invadiu minha roça...he...
eu preparei uma armadilha, cheguei perto dele
comendo meu milho em...vou lhe pegar
ele balançou a cabeça, ligou as Atenas
torceu o rabo torceu, torceu, torceu
deu corda e disparou...
deu um pulo tão danado na cerca
que nem triscou na minha armadilha
correu uns 10 metros, fez meia volta, olhou pra mim e me gozou...seu
Luiz...seu Luiz
comi seu milho...e como e como e como e como
filho da peste comeu mesmo...
mas eu gosto dele...
porque ele é servidorzinho que é danado
animal sagrado...jumento meu irmão eu reconheço teu valor...tu és um
patriota, tu és um grande brasileiro...eu to aqui jumento, pra reconhecer o teu
valor meu irmão...
Com certeza, a Paraíba não é apenas feitas de zés, como diz Jackson do
Pandeiro na sua música “Como tem Zé na Paraíba”. Ele mesmo que se chamava José
Gomes Filho, natural da cidade de Alagoa Grande, de baixo ou de riba, também
era um Zé nascido na Paraíba.
Mas, por lá também proliferam os severinos nordestinados. E foi em
Itabaiana, no dia 26 de maio de 1930, que veio à luz um severino cujo destino
era torna-se famoso no mundo inteiro empunhando uma sanfona, entre outros
instrumentos.
Distante aproximadamente 70 quilômetros da capital do Estado, João
Pessoa, e com sua população estipulada hoje em pouco mais de 24 mil habitantes,
a cidade foi o berço natal de Severino Dias de Oliveira, mais conhecido como
Sivuca.
Predestinado, aos nove anos de idade, em 1939, no dia de Santo Antônio,
ganhou uma sanfona de presente do pai, aventurando-se a tocá-la em feiras,
festas e batizados.
Aos quinze anos de idade, chegou ao Recife, contratado para tocar na
Rádio Clube de Pernambuco, depois de se apresentar em um programa de calouros
comandado pelo jornalista Antônio Maria e despertar a atenção do maestro Nélson
Ferreira. No Recife, também integrou posteriormente o cast da Rádio Jornal do
Commercio.
Em 1955, mudou-se para o Rio de Janeiro. De lá para outros lugares do
mundo, foi um pulo. Morou em Lisboa, Paris e Nova York, onde durante anos
trabalhou com Miriam Makeba, sendo responsável, inclusive, pelo arranjo da
música “Pata Pata”, seu maior sucesso. Na terra de Tio Sam, após ter se
desligado de Makeba, em 1969, dirigiu musicais e trabalhou ao lado de gente
famosa como Betty Midler e Paul Simon, além de Hermeto Pascoal e Airto Moreira.
Em maio de 2003, Sivuca retorna para a sua Paraíba natal, fixando
residência em João Pessoa. No ano seguinte, descobre que o câncer nas glândulas
salivares, contra o qual lutava desde 1968, espalhara-se, atingindo o pulmão.
Mesmo com o estado de saúde se agravando, Sivuca continua trabalhando e
compondo. Em 14 de dezembro de 2006, vem a falecer em consequência de uma
insuficiência respiratória provocada pelo edema pulmonar.
O seu enterro, em João Pessoa, foi acompanhado por uma pequena multidão.