terça-feira, 25 de junho de 2019

QUASE HISTÓRIAS: DE PEÃO A MARAJÁ

Resultado de imagem para ilustração para peão
Como dia a música: "Vence na vida..."
Arte: pt.coolclips.com


A euforia de Antoninho Lisboa saltava aos olhos de todos. Cumprimentava quem cruzasse seu caminho, fosse amigo ou não, fosse conhecido ou não. Mandava beijos para crianças, fazia mesuras para as senhoras de meia idade para cima. Parecia candidato em campanha. Mas, Lisboa, como todos o chamavam, não era candidato a nada, exceto a viver a vida. Na véspera, saíra sua aposentadoria. E que aposentadoria! Vencimento integral, equivalente ao que recebia na ativa, coisa de cinco vezes o teto de INSS. Ainda era novo, saúde em perfeitas condições. O que mais alguém pode querer? Ia pelas ruas cantarolando aquela música de antigas festas de fim de ano, embora estivéssemos na Quaresma: “Adeus, vida velha; feliz, vida nova. Muito dinheiro no bolso, saúde pra dar e vender”.  


Lisboa lembrou-se de comprar algum presente e fazer visita ao doutor Quirino. Precisava agradecê-lo. E muito. Ninguém fez por ele o que o-ex-diretor-geral da Câmara Municipal lhe fez. Ninguém. Nem o próprio pai. Primeiro doutor Quirino, deu um jeito para que ele passasse no concurso para ajudante geral. O salário não era nem uma maravilha, mas também não era de se jogar fora. Em seguida, o tutor o chamou para uma conversa reservada. Até hoje, Antoninho Lisboa lembra-se com exatidão daquelas sábias palavras:

- Meu querido Lisboa, eu vou lhe pedir duas coisas: (1ª) que você acredite em mim e (2ª) que você se deixe levar pela engrenagem da Câmara. Enquanto eu estiver no comando, para você, o céu será de brigadeiro. Mas é fundamental que tenha paciência.

Resultado de imagem para ilustração para marajá
"... quem diz 'sim'"
Arte: Depositphotos

Três meses depois, doutor Quirino o chamou para uma segunda conversa:

- Meu amigo, a partir da próxima semana, você irá trabalhar para o vereador Vadão. Ele vai lhe dar um cargo comissionado. Só que você terá que lhe devolver a diferença.

- Que vantagem eu levo, doutor Quirino? Perdão, eu não entendi.

- Várias. Você não precisará vir à Câmara às segundas e sextas. Com sua habilidade, não terá dificuldades para arrumar uns bicos, a fim de reforçar o orçamento. O mais importante, porém, é que, de tempos em tempos, parte do seu salário de assessor será incorporada ao seu salário de origem. E isso ninguém mais lhe tira. Quando você se aposentar, terá uma baita aposentadoria. E tem mais: vou pedir ao vereador Vadão que lhe dê R$ 500 a mais por mês. Ou seja: você começa como peão e termina como marajá. Entendeu?

- Entendi. Como posso lhe agradecer?

- Não se preocupe com isso, querido. Apareça em meu apartamento aos sábados. Tenho andado muito só, carente mesmo. E não se esqueça: deixe-se levar pela engrenagem.

E assim foi feito. 

(ORLANDO SILVEIRA – ATUALIZADO EM JULHO DE 2019)

2 comentários: