-- Sei que vocês, jornalistas, embora vivam das letras, têm um gosto especial pelos números. Mas eu não me fio muito neles, não – iniciou a conversa o Velho Marinheiro, como quem não quer nada, mas louquinho da silva para enveredar pela discussão política. |
Ananias, nosso repórter em fim de carreira, mordeu a isca:
-- Os números dão credibilidade à reportagem. Além do quê, os números
não mentem.
-- Sei disso. Mas não se pode dizer o mesmo de quem produz e interpreta
os números. Tenho pra mim que eles enganam tanto quanto as palavras, se não
enganarem mais. Não por acaso, políticos são obcecados por números. E isso não
é uma escolha casual.
-- Mas os números, Velho Marinheiro, permitem comparar o que governos
fizeram. Dão ao povo condições de escolher com critério seus representantes –
argumentou Ananias com sua sabedoria de botequim.
-- Bobagem, meu jornalista. Se isso fosse verdade, não teríamos os
governos que temos. A opinião do povo não é parâmetro pra nada. De que vale
dizer que este governo construiu em quatro anos o dobro de casas e hospitais em
relação a seu antecessor, se está deixando a conta para o sucessor? Ora,
construir e não pagar é coisa fácil, qualquer um pode fazer. Até nós dois –
dois bestas. Quer outro exemplo, Ananias? Se a dita economia mundial está
superaquecida, se os preços dos produtos estão nas alturas, é natural que, em
termos absolutos, em termos de grana, as exportações cresçam. Isso é fruto de
uma série de fatores. Não é obra de um governo...
-- Está certo, está certo, mas...
-- O que importa é saber o quanto avançamos em relação aos outros. Qual
o quê! O Brasil não vai de fato pra frente porque não gosta da verdade, prefere
se comparar com ele mesmo. É mais fácil e de grande utilidade para o jogo
político rastaquera que aqui se pratica, no qual o roto fala do rasgado.
-- Pensando bem...
-- Pensando bem vamos pedir logo a saideira. Romualdo Bastos está
chegando com aquela sua empáfia de cruzadista.
(OS 2014 - atualizado em dezembro de 2019)
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