terça-feira, 2 de outubro de 2018

E O AMOR SAIU PELA JANELA: CENA VIII

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Ilustração: Arquivo Google


- Inês, eu sou obrigado a admitir: você ganhou a batalha da comunicação. Tanto fez, tanto faz que os filhos – todos eles, sem exceção – não estão nem aí comigo. .   

- Pelo amor de Deus, Jorginho, vai começar? É segunda, a casa está de pernas para o ar. Em vez de ficar reclamando, inventando coisas, você devia é me ajudar. Ontem, não foi tudo bem? O que mais você quer? Todo mundo comeu, bebeu, conversou, deu risada, não teve sequer uma discussão. Até você se comportou: bebeu, mas não encheu a cara nem o saco de ninguém. Coisa rara, convenhamos.

A guimba ainda fumegava no cinzeiro, mas Jorginho tratou de acender outro cigarro. Sinal de que não havia dado os trâmites por findos. Retomou a velha cantilena:

- Não acredito que você não perceba. Tento puxar conversa, mas é impossível. As respostas são todas monossilábicas. Agem como se eles estivessem me fazendo um favor. E o que é pior: as duas noras e os dois genros seguem a mesma trilha. Verdadeiro complô. Daqui a pouco, serão os netinhos. Fico sabendo por terceiros que o Júnior trocou de carro, que a Maria foi promovida no serviço, que Isaura conseguiu o título de doutora... Mandam as fotos das crianças só para você.

- Jorginho, o que você quer que eu faça? Fale com eles?

- Nem pensar. Nem pensar.

- Por que não?

- Inês, eu não sou homem de passar recibo.

- É verdade. Orgulhoso, você nunca passou recibo. Em compensação, deixou rastros por toda parte. Ora, eles não gostam que você beba e faça piadas tolas na frente de todos. Eles não esquecem o caso que você teve com aquela mulher. Por eles, eu não vivia com você há muito tempo.

- Aquilo é coisa do passado. Faz tanto tempo, francamente. E, de lá para cá, nunca mais aprontei, Inês. Você sabe disso.

- Quem apanha não esquece. Eles eram pequenos. Sofremos um bocado.

- Por que você está comigo, se por eles... Você ainda me ama, Inês?

- Jorginho, vai tomar seu aperitivo, vai. Não vou fazer almoço hoje. Sobrou muita coisa de ontem.

(Orlando Silveira – ATUALIZADO EM AGOSTO DE 2018)


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