DE
BOBO O BOBO DA CORTE NÃO TEM NADA
O
bobo era quem contava ao rei o que ninguém queria
que
o rei ficasse sabendo
Por Maria
Helena Rubinato Rodrigues de Sousa
Blog
do Noblat
03/03/2017
- 01h25
Estamos
sempre associando os Bobos da Corte ao divertimento, às palhaçadas, às
gargalhadas, ao prazer que davam ao rei com suas piadas e brincadeiras. Mas
esse não era seu principal papel, segundo o grande filósofo do século XVI,
Erasmo de Rotterdam: o bobo era quem contava ao rei o que ninguém queria que o
rei ficasse sabendo, ele era o espelho de todo o grotesco dos hábitos da Corte.
Feste,
o bobo sábio de William Shakespeare em sua comédia “Noite de Reis”, é quem tem as falas mais importantes da peça. É
ele quem diz a verdade não apenas para os outros personagens, como para a
plateia.
Em
"Rei Lear", o bufão não
tem nome, ele é simplesmente Fool. Desde o início da grande tragédia, ele vê as
filhas do rei como elas realmente são e prevê que a decisão final do rei será
desastrosa.
Como
disse outro brilhante escritor, um dos maiores do século XX, Isaac Asimov, em
seu 'Guia para ler Shakespeare':
"Esse é, evidentemente, o grande segredo do Bobo bem sucedido - ele não
tem nada de bobo".
Marcelo
Odebrecht, o herdeiro da maior empresa do Brasil, e que não tem nada de bobo,
disse em seu depoimento ao Tribunal Superior Eleitoral sobre as doações de sua
empresa à chapa Dilma/Temer, eleita em 2014: “Eu não era o dono do governo, eu
era o otário do governo. Eu era o bobo da corte do governo”.
Ele
pensa que vai nos confundir com as palavras. Bobo da Corte é o bufão, o jester dos ingleses. Foi vertido para o
português como Bobo da Corte por conta de suas anedotas, danças e piruetas. Uma
tradução... boba. Mas o que não quer dizer que fosse bobo no sentido de tolo,
de pouco inteligente.
Assim
como Marcelo Odebrecht não é nada bobo, nem engraçado como os jesters das cortes europeias. Ele era,
sim, o cara com a caneta mais cheia de tinta do Brasil. O príncipe dos
empreiteiros, o que fazia chover dinheiro nos bolsos da Corte.
Bobo,
o preso que está controlando perfeitamente sua prisão e seu processo? Conta
outra, seu Marcelo. Essa não cola. Na verdade, você foi otário, sim, ao se
deixar vencer pela ambição desvairada. Mas isso não quer dizer que tivesse sido
o Bobo da Corte. Foi, sim, o dono do governo, o sujeito de quem a Corte
dependia para suas tratantadas.
Nem
a desculpa de não saber bem o que quer dizer Bobo da Corte você tem. Afinal,
neto e filho de homens ricos, imagino que tenha tido uma boa instrução e que
soubesse muito bem qual o verdadeiro papel do Bobo da Corte. Pelo menos agora
vai ficar sabendo, não é? As delações são as falas dos Bobos da Corte sobre a
verdade dos fatos.
O
diabo é que, em nossa Corte, só a metade da verdade é verdadeira. E a metade
que é verdadeira vive trocando de lado com a metade que é falsa. Fica
complicado, não é? Mas nós, os que nunca pisamos nos tapetes da Corte, e que já
estamos cansados de esperar pelas revelações das delações, não vamos aceitar
esses vazamentos que insinuam mas não provam. Queremos a verdade inteira,
completa, despida de toda e qualquer fantasia.
O
Brasil precisa andar!
Maria Helena Rubinato
Rodrigues de Sousa é professora e tradutora
***
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